MINHA “PRINCESA” MINHA

Por Zé Carlos Gonçalves

voo abraçado às lembranças,
que se insinuam,
pulsantes,
a me carregar nas entranhas
dos teus encantos

voo as tuas manhãs,
a explodir em vital energia,
que me alimenta,
abraçado pelo azul celeste
e
pelo verde campestre,
que me sustentam
leve
e
livre

voo os teus caminhos,
trançados em sabedorias,
abraçados pelas veredas,
que me conduzem
livre
e
leve

voo leve,
a te apreciar
em tuas belezas humanas,
acobreadas pelo sol,
baixadeiros benditos,
enrijecidos no trato da terra
no cabo da foice e da enxada
no caniço prenhe de piaba
de acará
de bagruinhos
na corda de couro
a domar o sacro leite,
alimento de todo dia

e

pelos teimosos sonhares
dos teus filhos bem amados

voo livre,
a receber o verdor do vento
a essência do capim
de marreca
o sussurro do Pericumã
e
os mistérios da Juçareira,
a te carregar amuleto meu,
único
e
único

voo, voo, voo,
nas asas das saudades,
impulsionado pela tua leveza
e
pela tua infinda liberdade.

ALCAP e município de Peri-Mirim promoverão o I Debate Público sobre o Autismo no município

No dia 12 de abril de 2024 às 08:30h reuniram-se na Sala do Empreendedor do Sebrae , membros da Academia de Letras, Ciências e Artes Perimiriense (ALCAP) e secretarias municipais de Peri-Mirim para discutirem acerca dos detalhes sobre o evento I Debate sobre o Autismo no Município de Peri-Mirim, como o tema “Ler e Escrever: Direitos de Todos” que ocorrerá no dia 26 de abril deste ano, no horário de 08 às 11 horas no Clube da Cidade.

O debate contará com a presença de vários profissionais que atuam no cuidado com pessoas portadoras de transtorno do espectro autista (Tea), tais como: Psicopedagogo, Psicólogo, Educador Físico, Social: Terapeuta, Fonoaudiólogo e Assistente Social.

Ficou decidido que o cerimonial fica a cargo de Diêgo Nunes. A identidade visual do Debate – previsto para sair no mesmo dia. Confecção de Camisas: verificar preço e serão disponíveis para venda. Decoração por conta da Secretaria de Ação Social: Zilda. Ofícios para: autoridades eclesiásticas; Conselho Tutelar, etc. Lacinhos para lapela de todos os participantes e Credenciamento dos participantes mediante lista de presença.

Sobre a Oficina de Desenhos foi decidido que ficara para outro momento e que será abrangente, provavelmente em novembro.

Participaram da reunião: Ana Creusa Martins, Cíntia Serrão, Nasaré Silva, Francisco Viegas, Diêgo Nunes, Giselia Martins, Ana Cléres, Maria do Carmo Pinheiro, Cleonice Santos, Paulo Sérgio, Maninho Braga e Aparecida.

Fonte: https://oresgate.net.br/

CENAS DO COTIDIANO XXIV: É tempo de chuva (… nem sempre “Graça” é “ela”)

Por Zé Carlos Gonçalves

… e a chuva vem fazendo estrago, mesmo “não se decidindo”. Chove, e vem o calor infernal; chove, e vem o calor infernal. Esse tal “El Nino” deve ter fugido de “um caldeirão de breu”. “Ah, muleque pra gostar de infernizar a vida alêia!” Imagina, quando ele se tornar “El adulto!” Estaremos, literalmente, “fritos na banha do mosquito!”

… e, por falar em tempo de chuva, achei fantástica a conversinha de dois adolescentes, que caminhavam à minha frente e reclamavam do corte da mesada e da impossibilidade de “fumá um basiado”. Se bem que nem sei se ainda se utiliza esse termo. “Basiado”. Mas … o importante é que entendam. Voltemos. Um dos “indivíduos” ia se queixando de não ter “discolado bufunfa”, para comprar sequer “um cigarrinho do demônio”. E, ainda, “me saiu com esta”, que achei “mara”. E não é “nenhuma” mulher! Achei “mara” foi a forma do lamento. “Nunca mais choveu na minha horta!” Definitivamente, espetacular! E que “El Nino” continue “a passear pelas suas lisuras”. Deles, os indivíduos!

.. e, pegando carona na “linguági do tal elemento”, vou fazer um pedido ao meu confrade, na ALEART. Camarão, “faz chover na minha horta!” Hum, não pensem besteira! Que fique bem claro, o meu “quinhão” do FUNDEF! Até está chovendo, mas o calor é dantesco. Também “sou filho de Deus”, quero um “arcom!”

… e, como dizia minha avó, em sua sábia sapiência, tempo de chuva é tempo de “fumaçar” … Não vão pensar besteira, de novo! É tempo de fumaçar arroz, feijão e, principalmente, “aboba”. E, para não perder o raciocínio da vovó, tempo, também, de falar besteira. Ah, Pinheiro já tão desmoralizada. “Intonce, muito coidado!” Que não venha mais vergonha … Nem sempre “Graça” é “ela”. Desta vez, é o consagrado escritor!

… e, como é tempo de chuva, vamos aproveitar e ler “Canaã”. Talvez, dali saia alguma inspiração!

… e, com tanto “relâmpu i truvão”, é propícia, mesmo, muita confusão. Até rimou! Cuidado! Pessoa é Fernando. E Eça de Queirós é José Maria. Difícil, né?!

… e vamos, sem pressa, para não tropeçarmos!

Robert Oppenheimer, o pai da Bomba Atômica

Christopher Nolan sobre J. Robert Oppenheimer, “a pessoa mais importante que já existiu”.

No Marco Zero, a areia derreteu na bola de fogo e choveu de volta ao solo, onde se solidificou novamente na forma de um mineral – o que hoje chamamos de trinitina, devido ao nome do local: Trinity.

Relembrando o momento 20 anos depois, J. Robert Oppenheimer, o homem que a história chama de “o pai da bomba atômica”, disse que isso trouxe à mente uma linha das escrituras hindus: “Agora me tornei a morte, o destruidor de mundos”.

Christopher Nolan, o diretor por trás de filmes como “Dunquerque”, “A Origem”, “Interestelar” e a trilogia “Cavaleiro das Trevas”, passou os últimos três anos vivendo no mundo de Oppenheimer, escrevendo e dirigindo o filme “Oppenheimer”, afirma que: “Vejo Oppenheimer como a pessoa mais importante que já existiu”, disse ele a Martin. “A história de Oppenheimer é uma das maiores histórias imagináveis.”

“Ao liberar o poder atômico, ele nos deu o poder de nos destruirmos que nunca tivemos antes, e isso muda a equação humana”, disse Nolan.

Kai Bird é co-autor de uma biografia de Oppenheimer ganhadora do Prêmio Pulitzer, “American Prometheus”, na qual o filme é baseado. “É complicado encarar um ícone histórico como Robert Oppenheimer e lidar com a história fielmente e ainda assim transformá-la numa experiência cinematográfica”, disse Bird.

Martin perguntou: “Você teve dúvidas sobre o que Hollywood faria com todas as suas pesquisas?” Martin disse a Nolan: “Para dramas humanos de alto risco, é difícil melhorar os fatos históricos”.

Nolan respondeu: “Não conheço nenhuma outra história tão dramática quanto Oppenheimer e seu envolvimento no Projeto Manhattan” – o codinome da corrida para construir a bomba.

Oppenheimer (interpretado no filme por Cillian Murphy) estava ensinando física quando foi recrutado por um rude general do Exército, Leslie Groves (interpretado por Matt Damon). Bird disse: “Oppie tinha então, você sabe, 38 anos, nunca administrou nada além de seus alunos de pós-graduação, mas Groves o selecionou.”

“O que as outras pessoas acharam da escolha de Groves?” perguntou Martinho. “Eles acharam que era estranho.”

Além da falta de experiência, Oppenheimer tinha ligações comunistas. “Ele levou muito tempo para conseguir uma autorização de segurança”, disse Bird. “A esposa dele, Kitty, era membro do partido há muito tempo.”

E o que Groves achou disso? “Ele achou que Oppie seria quem lideraria este projeto e foi uma escolha brilhante”, disse Bird. “Ele podia ver em Oppie a inteligência e o carisma para reunir todos esses cientistas nesta cidade secreta e fazer isso acontecer.”


Julius Robert Oppenheimer foi um físico teórico americano e diretor do Laboratório Nacional Los Alamos durante a Segunda Guerra Mundial. Geralmente, é creditado como o “pai da bomba atômica” por seu papel no Projeto Manhattan, o empreendimento de pesquisa e desenvolvimento que criou as primeiras armas nucleares.

A verdadeira história do “milagre” de Paulo Freire

Por Eli Vieira*

O conto de fadas “O Alfaiate Valente”, história popular alemã com primeira aparição impressa em 1557 e recontada pelos irmãos Grimm e Walt Disney, tem como título alternativo “Sete de uma tacada só”. É porque o protagonista, ao servir geleia, mata sete moscas de uma vez. Ao sair pelo mundo contando a história, as pessoas entendem que ele se referia a sete homens ou sete gigantes, começando assim uma trama de mal-entendidos em que as capacidades do alfaiate são exageradas.

Trama similar aconteceu com o professor pernambucano Paulo Freire (1921-1997), declarado patrono da educação brasileira por uma lei de 2012. Como contou o Ministério da Educação na época, Freire, em 1961, quando diretor do Departamento de Extensões Culturais da Universidade de Recife, “montou uma equipe para alfabetizar 300 cortadores de cana em 45 dias” no município de Angicos, no Rio Grande do Norte, na época com 75% de taxa de analfabetismo. O método de Freire seria audiovisual e fonético, com uso pioneiro de projetores de slides e palavras comuns para o vocabulário da própria comunidade.

Mas o designer Cícero Moraes, em um artigo em pré-publicação postado na rede social acadêmica ResearchGate, lança dúvida nos números e métodos. Os formandos do curso “na verdade eram 122” e os alunos não foram plenamente alfabetizados, só “aprenderam a escrever o nome, ler e escrever algumas poucas palavras”. Em conversa com a Gazeta do Povo, Moraes, que tem experiência em ensinar computação gráfica desde 2001 e ensina técnicas avançadas de planejamento cirúrgico para pessoas de 27 países, diz que leu Paulo Freire ainda na graduação e sempre achou a abordagem do educador “pouco objetiva e pouco útil”.

Na publicação, o designer de Sinop (MT) — que se especializou em produzir modelos tridimensionais e entrou para o livro Guinness em 2021 após reconstruir um casco artificial para um jabuti vítima de um incêndio — vai além. O projeto de Paulo Freire não teria acabado por causa da repressão política da Ditadura Militar (embora Moraes não conteste que ele foi perseguido e tenha se exilado), mas por causa da “deficiência de material voltado à alfabetização e o excesso de politização das aulas”. Para o projeto de alfabetização, Freire, apesar de compartilhar do antiamericanismo dos colegas de ideologia, aceitou dinheiro do governo dos Estados Unidos porque seria, na sua visão, um recurso que “voltava ao Brasil” porque o último seria “explorado” pelo primeiro. Também houve apoio do vigário de Angicos, que cedeu espaço da paróquia católica para a empreitada. Os recursos americanos eram da iniciativa “Aliança para o Progresso”, da USAID (Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional).

Trezentos de uma tacada só?
A revista O Cruzeiro, em sua edição 30 de 1963, conta que o presidente da República, João Goulart, deu a aula de encerramento do curso de Freire, a quadragésima hora-aula. “Trezentas pessoas inteiramente analfabetas aprenderam a ler e escrever em 40 horas de aula”, informou a revista, que curiosamente também alegou que o método de alfabetização preocupava “maus políticos e os comunistas”, apesar de Paulo Freire ser famoso por sua base marxista.

No mesmo ano, o New York Times noticiou o sucesso do programa de Freire abrindo uma reportagem com a história da mãe de seis filhos Maria Pequena de Souza, 32 anos, que verteu lágrimas ao conseguir escrever uma palavra. O jornal também destacou as meras 40 horas do curso, mas apontou que havia politização: “Enquanto aprendem a ler, os adultos ouvem que (…) ‘a reforma agrária é necessidade urgente’”. Outra aluna, a lavadeira Francisca de Andrade, teria escrito ao presidente que “não sou mais das massas, pertenço ao povo e posso defender meus direitos”, mencionando reforma agrária. O jornal americano já desmente em 1963 a informação do Ministério da Educação: “150 adultos completaram o curso e 135 foram considerados alfabetizados com base em testes escritos e cartas escritas ao presidente Goulart. Os alunos também foram avaliados quanto à consciência política”.

Cícero Moraes, contudo, usa outra fonte: o livro “As Quarenta Horas de Angicos” (Cortez, 1996), de Carlos Augusto Lyra Martins, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte que coordenou os trabalhos pedagógicos em Angicos na época. Os dados fornecidos por Lyra mostram que a evasão estava alta no curso de Freire: uma semana e meia após o início, o número de presentes caiu pela metade, resultando em uma média de 115 alunos por dia. O número de monitores envolvidos, de 21, também parece ter caído para 14 nos diários de classe arquivados. É do livro o número 122, o total de alunos que fizeram a avaliação final.

Moraes não duvida que as aulas tenham dado uma injeção de ânimo para uma comunidade pobre e esquecida, mas questiona o método: “visto que a cada dia era ministrada apenas uma hora de aula e parte dela era tomada por debates, como os alunos teriam tempo e condições para aprender a ler e a escrever?” Ele faz uma comparação com o programa mais moderno do Instituto YDUQS, que “demanda 144 horas, ou seja, 3,6 vezes o período do projeto original de Freire”, habilitando os estudantes para usos simples da língua como uso de transporte público. A avaliação final em si teve problemas: os monitores rejeitaram os testes finais do Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife e resolveram elaborar suas próprias avaliações. Foram duas provas, uma de alfabetização e outra de politização.

Um terço dos 122 não passou na prova de letramento. Mas o resultado da politização foi melhor, com 87% de aprovados. As duas notas então foram mescladas, fazendo com que a nota da politização puxasse para cima o resultado em alfabetização, o que o autor do artigo chama de “jeitinho brasileiro” para “aprovar um maior número de pessoas ao reduzir o peso da alfabetização… em um programa de alfabetização”.

Tinha como dar certo?
Cícero não está sozinho em seu ceticismo ao reavaliar a história de educador valente de Paulo Freire. “Ninguém cortava cana. Não se plantava cana em Angicos”, desmente o professor Ronai Pires da Rocha, doutor em filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, professor da Universidade Federal de Santa Maria e autor do livro “Quando ninguém educa: questionando Paulo Freire” (Editora Contexto, 2017).

Rocha conta que a cultura principal de Angicos era o algodão mocó, seguido por cabras, ovelhas, vacas e a fabricação de linha de costura. Ele cita como fonte o livro “40 Horas de Esperança: o método Paulo Freire” (Editora Ática, 1994), de Calazans Fernandes e Antonia Terra. A obra também afirma que os alunos do curso de Freire só começaram a tentar formar frases na 37ª hora das menos de 40 totais do curso. “Ao se aproximar do final do curso, os alunos começaram a dizer que não sabiam escrever ou que sentiam dificuldade de leitura, quando já haviam dominado as mesmas dificuldades em outras situações”, escreveram Fernandes e Terra. Os monitores interpretaram essas reclamações como uma forma de retardar o fim do curso para manter a relação afetiva que formaram com os mestres.

“As duas coisas eram verdadeiras, eu acho”, comenta Ronai Rocha. “Os alunos foram, a rigor, familiarizados com letras e palavras, aprenderam a assinar o nome e a ler coisas muito simples ligadas ao que havia sido trabalhado nas aulas”, resume o especialista, que já trabalhou com alfabetização de adultos.

“É muito difícil alfabetizar adultos e, a rigor, deveríamos fazer uma espécie de gradação nas habilidades que eles vão conquistando, sendo que o teste final ideal, de escrita de um bilhete, uma cartinha, com ortografia e sintaxe razoáveis, é bem demorado”, explica Rocha.

Concorda com Rocha a professora Simone Benedetti, autora do livro “A falácia socioconstrutivista” (CEDET, 2020), um apelo para uso de bases científicas para o letramento no Brasil. Ela imagina que é mais difícil alfabetizar adultos “dado o menor nível de plasticidade e especialmente se o adulto tiver problemas de processamento auditivo e fonológico”. Para ela, “45 dias parecem pouco” para a aquisição integral das competências de uma pessoa capaz de ler e escrever com fluência.

O método de Paulo Freire não é tanto de Paulo Freire
Independentemente, Benedetti e Rocha contaram à Gazeta do Povo que o método de Freire existe, mas que não é exatamente “dele”, dando cada um peças do quebra-cabeça histórico do desenvolvimento da técnica. Benedetti aponta que Freire “se ‘apropriou’ de uma ideia pedagógica de um missionário norte-americano chamado Laubach e, aqui no Brasil, essa ideia de usar palavras ‘significativas’ para o aprendiz misturou-se às ideias equivocadíssimas da Emília Ferreiro, o que resultou no que chamo de ‘desensino’, pois não se oferece informação explícita aos alunos sobre o funcionamento do código escrito e seus padrões”. Em vez disso, detalha a especialista, espera-se que o aluno faça suas próprias inferências sobre a gramática e a grafia. Essa abordagem “nunca funcionou”, mas seus defensores insistem que “nunca foi aplicada” ou “os professores é que não sabem trabalhar”. No entanto, “é apenas ela e somente ela que é ensinada nas faculdades de pedagogia do país”, lamenta Benedetti.

Outra fonte de Freire que caiu no esquecimento, informa Rocha, foi um “Livro de Leitura para Adultos”, uma cartilha elaborada pelas pedagogas Norma Porto Carreiro e Josina Godoy, elogiada efusivamente pelo famoso educador Anísio Teixeira em 1962, ano em que a equipe de Freire mandou uma estudante para coletar as 400 palavras mais usadas pelo povo de Angicos. “Considero essa cartilha a melhor cartilha para adultos analfabetos que, até agora, conheci no Brasil”, disse Teixeira em outubro de 1962, na época à frente do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos.

Freire soube da cartilha quando ainda estava sendo elaborada por Norma Carreiro e disse, numa reunião de funcionários do Movimento de Cultura Popular, da prefeitura de Miguel Arraes no Recife (1960-1963), que estava pensando na alfabetização de adultos, “mas sem cartilha”. A informação é do livro “MCP: história do Movimento de Cultura Popular” (CEPE, 2012), de Germano Coelho. O autor acrescenta que encorajou Freire a trabalhar na questão da alfabetização com as palavras do ditador genocida comunista Mao Tse-tung: “É preciso deixar florir mil flores”. O MCP era “laboratório de novos métodos e novas técnicas de ensino”, contou Coelho. As ideias desenvolvidas no livro mais famoso de Freire, “Pedagogia do Oprimido” (Paz & Terra, 2019) vieram só depois da cartilha para “iluminar a prática” com ideias políticas.

A obra relata que a ideia de Freire era dar cursos com inspiração na cartilha de Carreiro, mas sem entregá-la aos alunos. “Ou seja, ele pegou o bonde andando”, comenta Ronai Rocha, “e teve a sacada de fazer a coisa em pílulas, de forma mais participativa. Mas a Norma e a Josina ficaram esquecidas nessa história”.

Freire acabou sendo acusado de plágio, como ele próprio comenta em nota de rodapé do livro “Educação como prática da liberdade” (Paz & Terra, 2019): “nunca nos doeu nem nos dói quando se afirmava (…) que apenas fizemos ‘um plágio de educadores europeus ou norte-americanos’. E também de um professor brasileiro, autor de uma cartilha”. O educador se justifica: “a respeito de originalidade sempre pensei como [John] Dewey [filósofo americano], para quem ‘a originalidade não está no fantástico, mas no novo uso de coisas conhecidas’. O que nos deixa perplexos é ouvir ou ler que pretendíamos ‘bolchevizar o País’.”

O que explica a ascensão meteórica do alfaiate valente da educação?
Por que Paulo Freire se tornou tão célebre no Brasil e no mundo? Internamente, Rocha pensa que foi uma questão de conveniência:

“a grande promoção que o método teve estava ligada ao fracasso das leis que permitiriam o voto do analfabeto. Como a esquerda não conseguiu aprovar essas leis, a ideia era fazer uma alfabetização em massa e rápida. Esse contexto foi decisivo para que Freire tivesse o apoio governamental que teve”.

Nem todos os contemporâneos acreditaram na reputação ilibada do alfaiate valente da educação, informa Rocha. Francisco Julião Arruda de Paula (1915-1999), advogado atuante nas Ligas Camponesas do Partido Comunista Brasileiro que conviveu com Freire no exílio no México, escreveu com aparente sarcasmo que “nosso Paulo, barbado como um profeta, puxado a Buda, com sua mania de feijoada e seu modo de ser, sempre repousado e provincial dentro de seu universalismo, era uma flor de maracujá-peroba, porque chamava a atenção de todos!” Depois, no mesmo texto, parece ter mandado uma indireta a respeito de compatriotas “que eu mandaria à Lua na esperança de que a árida solidão os humanizasse e os fizesse sentir que fora da solidariedade não adianta que alguém bata no peito e diga: eu sou revolucionário! Eu sou marxista! Eu sou cristão”. Na época, Freire fora trabalhar para o Conselho Mundial de Igrejas e se dizia marxista e cristão. Outro militante comunista da década de 1960, Flávio Tavares, creditava a projeção do educador à generosidade dos comunistas.

No resto do mundo, Freire bateu recordes com 35 títulos de doutor honoris causa e já foi citado mais de 550 mil vezes no Google Acadêmico — mais que Albert Einstein e Charles Darwin. Mas céticos começaram a aparecer. No livro “A marxificação da educação: o marxismo crítico de Paulo Freire e o roubo da educação” (New Discourses, 2022; trad. livre, sem edição no Brasil), o matemático e ativista americano James Lindsay faz duras críticas ao brasileiro. O autor pensa que Freire “revela o suficiente de seu caráter pelos nomes que invoca repetidamente: Karl Marx, G. W. F. Hegel, Vladimir Lênin, Mao Tse-tung, Fidel Castro e, com lugar de destaque, Che Guevara. Poucos teóricos da educação (pedagogos), se algum, são mencionados, citados como referência ou aplicados”.


*Eli Vieira é biólogo, mestre em biologia molecular pela UFRGS e mestre em genética pela Universidade de Cambridge, Reino Unido. Escreve para o público em blogs desde 2007, ganhou em 2014 o Outreach Fund da Sociedade Europeia de Biologia Evolutiva, e suas publicações acadêmicas já foram citadas mais de 700 vezes. Colabora com a Gazeta do Povo desde 2020.
Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/

MATINHA 75 ANOS – Avenida Major Heráclito

Por Aroucha Filho*

Em todo o mundo, as cidades têm referências que lhes são peculiares. Museus, monumentos, fontes, palácios, catedrais, parques, teatros, praças, etc… Esses são locais que os turistas buscam em suas visitas.

Eu sempre busco os museus e as igrejas, como indispensáveis nas visitas aos lugares que me destino a conhecer.

 As avenidas são marcas relevantes nas cidades, assim temos: a Champs Élysées, em Paris, com seu destacado Arco do Triunfo; a 9 de Julho, em Buenos Aires, com o seu simbólico Obelisco; a Avenida da Liberdade em Lisboa, com seus 90 metros de largura; em Santiago a Avenida Libertador General O’ Higgins, mais conhecida como Avenida Alameda, com seus 8 km de extensão. Deixei a que mais frequento e adoro passear por ela, para citar por último, trata-se da Avenida Paulista, onde sempre me hospedo em São Paulo. Eu tenho uma grande atração e intimidade com a Paulista, frequento-a quando em São Paulo, diariamente. Sou um assíduo frequentador do MASP. No entanto, a Avenida que mais me encanta e me fascina é a avenida em que nasci no ano de 1951. Uma avenida mística, indelével na minha memória. Possui um simbolismo histórico, tem charme e importância na vida da cidade. Percorri todo esse caminho para referir-me à Avenida Major Heráclito Alves da Silva, na cidade de Matinha – Maranhão. Tão importante para os matinhenses quanto as supracitadas.

A Avenida Major Heráclito nasceu junto com a cidade. Os primeiros traços da urbanização da sede do município foram implantados nesse logradouro. A marcante característica urbana, que se apresenta com ruas largas, teve origem no traçado dessa avenida, irradiando esse aspecto para as demais vias que foram se abrindo com o processo de expansão urbanista da sede do município.

A Major Heráclito com os seus 1300 metros retilíneos de extensão, medindo em média 17 metros de largura, nasce na Avenida José Sarney, que até a década de 60 era denominada rua João Pessoa. Se estende até encontrar a MA 014. Antes da construção da MA 014, chegava até o portão do Campo de Aviação. O primeiro prédio era o Abrigo, local onde ficavam os passageiros para aguardar os aviões teco-teco que faziam linha (voos) para os municípios da Baixada Maranhense. Do outro lado da avenida a primeira casa era a residência do Sr. Teodomiro, bem próximo à cerca de proteção do aeroporto.

A avenida Major Heráclito foi e é a via mais importante da cidade de Matinha. Antes concentrava todos os órgãos e serviços público dos três poderes, nas esferas municipal, estadual e federal. Ficavam nesse logradouro a Coletoria Federal, a Agência de Estatística – IBGE e a agência dos Correios e Telégrafos. Meu pai era o responsável pela Agência dos Correios.

Nesse prédio público, eu nasci, e lá morei até o ano de 1961. Depois dos Correios, nesse terreno, por iniciativa do meu pai e outros moradores, foi construído o Grêmio Recreativo Matinhense 15 de Fevereiro, que funcionou como local de realizações das festas da sociedade matinhense, por um longo período. Hoje funciona a Loja do Armazém Paraíba.

No âmbito do poder estadual, ficavam a delegacia, a cadeia, o Hospital Dr. Afonso Matos, o Grupo Escolar Joaquim Inácio Serra e a Coletoria Estadual.

O Poder Municipal, a Câmara Municipal e as Secretarias funcionavam no prédio da Prefeitura, um imponente prédio com uma entrada principal, rodeado de janelões, com uma varanda interna em formato de L. Onde hoje é a residência do ex-vereador Sr. José Bonifácio, funcionou nas décadas de 50/60 um Colégio Municipal com duas salas de aula, o Coleginho, era assim chamado por ser próximo e bem menor que o Grupo Escolar Joaquim Inácio Serra, que na época era construção de maior porte do município.

À avenida Major Heráclito funcionaram lojas comerciais expressivas para o comércio local. Na esquina da prefeitura, hoje, casa da Sra. Livramento de Zé Mário, funcionou o comércio do Sr. Antônio Neves.

Naqueles tempos Matinha não possuía “luz elétrica”, refiro-me à segunda metade dos anos 50. O comércio do Sr. Antônio Neves era o principal distribuidor de querosene, combustível utilizado para “alimentar as lamparinas”, única fonte de iluminação das residências. Era rara a residência que possuía “petromax”.

Petromax designava uma marca de lampião utilizado na iluminação das residências. Essa marca de tão popular pelo seu largo uso, ficou designativa desses utensílios domésticos. O nosso era da marca “Coleman”, mesmo assim, era um “Petromax”

Por ocasião da posse do prefeito João Amaral da Silva, o segundo prefeito eleito de Matinha, um foguete atingiu o depósito onde eram guardadas as latas de querosene, provocando um grande incêndio. O primeiro grande incêndio registrado em nosso município.

Posteriormente esse ponto comercial foi adquirido pelo Sr. João Amaral Nunes, conhecido como João Barata, onde instalou uma grande loja de tecidos, armarinho e utensílios domésticos. No outro canto funcionava o comércio do Sr. João Lima, uma mercearia e bar, com uma bela mesa de jogo de bilhar. O mais importante comércio da avenida era pertencente ao Sr. Manoel Antônio da Silva, primeiro prefeito de Matinha, nomeado para instalar o município e promover a primeira eleição. Para esse pleito, fora eleito o primeiro prefeito de Matinha, o Sr. Aniceto Mariano Costa.

Esse comércio funcionava em uma loja geminada à residência do Sr. Manoel Silva, vendia de tudo. Adquiria e exportava para São Luís gêneros produzidos ou produtos extraídos no município: amêndoas de babaçu, tucum, farinha, arroz, etc… Não sei ao certo, porém, acho, que a primeira padaria de Matinha funcionou ali nos anos de 1949 a 1953. Tinha como padeiro chefe Ribamar Muniz (Ribamar de Honório), auxiliado por Nelson Alves – recém falecido – e Francisco Gomes da Silva (Chico Padeiro).  Em seguida essa padaria foi adquirida pelo seu genro Sr. Arnaldo Lindoso, operando-a até o ano de 1963. Padaria São José. Era uma padaria avançada para a época e seus produtos eram distribuídos em todo o território do município, com destaque ao pão massa fina e massa grossa, pão doce, bolacha doce, biscoito e a famosa bolachinha. Ah! Fabricava massas frescas (macarrão).  Eu como vizinho e amigo dos seus filhos, Carlos Eduardo e Carlos Antônio, tinha como divertimento arrumar as bolachinhas na forma, antes de ir ao forno para serem assadas. E claro, nos dava o direito de deliciar uma boa porção desse tradicional produto matinhense.

As melhores casas residenciais eram as edificadas na Av. Major Heráclito, na sua grande maioria de alvenaria e telha. Tempos em que ainda predominavam as casas construídas com taipa e palha.

A avenida já ostentava um belo conjunto arquitetônico, composto pelo prédio da prefeitura, o Grupo Escolar, o prédio do hospital, o prédio dos Correios, a imponente casa do Sr. Manoel Silva, com sua bela escadaria interna e o piso em sobrado de madeira de lei. Nas imediações de onde fica a casa do Sr. Sebastião Neves, existia duas belas casas no estilo “bangalô”, as primeiras desse tipo arquitetônico, de propriedade do município, essas edificações tinham plantas bem diferentes da arquitetura local. Era um estilo arquitetônico com linhas modernas, acesso por corredor descoberto e porta ao fundo; cumeira no sentido perpendicular à avenida; teto com duas águas e sem os usuais “espigões”.

Duas barragens de contensão construídas de alvenaria existiam na avenida para evitar erosão e facilitar a acessibilidade das pessoas no período invernoso, eram implantadas no sentido longitudinal à avenida. A primeira e a maior foi construída na década de 50, e ficava frontal à Praça de Eventos. Era longa, bem construída e possuía uma grande galeria por onde escoava as águas pluviais que se acumulavam em grande volume naquela área. A outra ficava nas imediações (hoje) do Depósito Leal, tinha a mesma finalidade; não possuia galeria, apenas um recorte por onde era drenada a água que escorria do transbordamento da Baixa de Crisóstomo. As águas dali alimentavam o Igarapé de Pito; a da outra barragem, o Igarapé do Gongo.

Em uma noite da década de 50, em procissão iluminada por velas, a comunidade católica saindo da Igreja de São Sebastião, conduzindo uma grande cruz, eu participei desse evento religioso, seguiram até às imediações da Padaria de Benedito de João Lima, e implantaram uma grande cruz de madeira, na cor ocre, bem no centro da avenida. Era um grande monumento da fé. Todos chamavam: O Cruzeiro. A intenção dos fiéis que caminharam nessa procissão, era, a exemplo do Cristo Redentor, monumento do Rio de Janeiro, deixar registrado um marco da fé ao cristianismo simbolizado por essa grande cruz.

Ali permaneceu por décadas. Sentados em sua base com dois degraus, reunia moradores para longas conversas de final de tarde.  Lamentavelmente não foi preservado.

O primeiro Mercado de Matinha também funcionou na Major Heráclito, era próximo à esquina da Prefeitura.

Enfim, essa larga e elegante avenida carrega o maior simbolismo urbano da nossa cidade.

Nessa avenida eu vivi alegre e feliz toda a minha infância, guardo até hoje as amizades, desta tão significativa fase da minha vida.

Todas as brincadeiras permitidas pratiquei nesse belo logradouro, joguei bola, empinei papagaio, andei de perna de pau, rodei ladeira a baixo dentro de pneus, joguei bolinha de vidro, pião feito de coco babaçu, jogo de chucho, banhei na Baixa de Crisóstomo, andei de bicicleta. Fiz muitas estrepolias por ali.

Hoje em homenagem aos 75 anos de emancipação política de Matinha, falar dessa imponente Avenida é o meu contentamento.

Parabéns Matinha!

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José Ribamar Aroucha Filho (Arouchinha) é natural do município de Matinha-MA, Engenheiro Agrônomo aposentado do INCRA, exerceu os cargos de Executor do Projeto Fundiário do Vale do Pindaré e Executor do Projeto Colonização Barra do Corda. Ex Superintendente do INCRA Maranhão. Foi Superintendente da OCEMA e Chefe de Gabinete da SAGRIMA.

Fonte: https://fdbm.org.br/matinha-75-anos-avenida-major-heraclito/

AS “VISITADORAS” DA ESCOLA (… e a FOBIA à escola)

Por esses dias, em uma fila de supermercado, “vi” uma conversinha, por demais interessante, de três meninas, sobre a volta às aulas. Até aí, tudo bem. Tudo normal. O excepcional é que a conversinha descambou para o particular interesse das mesmas, ao ir à escola.
Uma, entre “sorrisinhos sacaninhas”, descreveu, e empregarei o vocabulário delas, com toda fidelidade, “a bundinha absurda do teacher”, como “a coisa mais interessante” a se ter na volta às aulas. E, vejam só, já traçava planos de “mordiscar”, segundo ela, “aquela bundelícia!” Uau!
A outra se contorcia de ansiedade, e lamentava, e culpava o carnaval, por tão maldoso feriado, a vir atrapalhar a aproximação, que já estabelecia com “um pôdinho”, que, pelas “tatus”, lhe parecia ser “um elemento do ‘baralho”. Entenda por onde quiser ou por onde for possível imaginar. Misericórdia!
A outra outra se desfazia em olhares. Olhares, que reviraram que reviraram, ao falar da “tara”, que já alimentava por M________, “uma morena de olhos castanhos mel. Tão vivos, que me desnudam”. Falou, sim, senhor! E, mais. Falou de algumas estratégias, a serem usadas para “atrair ela pra minhas teia”. Que loucura! “Que interesse pela escola!”
Ouvi que ouvi. Ouvi tudo, “tintim por tintim”. Aí, né, cheguei a conclusão de que sou fruto de uma geração, que foi feliz por não conhecer o termo FOBIA. O mais perto que chegávamos disso foi FOBA. “Deixa de tua foba, rapá. Cumigo tu num pôdi!” E o máximo, que podia acontecer, era o uso das duas armas mais explosivas, que tínhamos.
A mais potente dinamite ou a mais devastadora granada. A CUSPIDA, na mão do adversário, ou o RETRATO DA MADRINHA, rabiscado, em riscos horríveis e disformes, no arenoso chão. E, a consequência, “a troca diuns supapos”, e, depois, só risadas. Hoje, a explosão é diferente. De verdade, é explosiva. E mortífera. Sem direito ao sentido conotativo. E, o pior, a palavra FOBIA domina a vida dos nossos jovens, tão perdidos, tão órfãos de pais vivos, tão tolos, como rebeldes. E, que se vangloriam, sem pudor, de serem adeptos da PROFESSORFOBIA, com exceção da citada aluna, uma quase antropófoga; e adeptos da ESCOLAFOBIA; e adeptos da ESTUDOFOBIA.
E, “para não perder a toada”, e a ironia, e fazer uma infame comparação, isso só me lembra um pinheirense, dos mais sábios, que não “aguentando” mais a chatice de “um chatíssimo cumpadinho”, metido a ser “besta, a sê u qui a folhina não marcava”, sempre que o encontrava, perguntava. “U qui tom dizeno da gênti pur aí”. E esperava um elogio, como sempre. Mas, desta vez, a resposta veio venenosa. Direta e certeira. “Qui nóis somo dois GRANDÍSSIMO, NOTABILÍSSIMO, BESTÍSSIMO!” Como dizia o primo Antônio Capilas, “justo e abotoado”. “O cabra procurou ‘foi’ o seu rumo” e passou a ignorar o compadre, “qui, infim, têvi sussego na vida”.
Ressalto que aqui são três “visitadoras” da escola, mas “é iscritinho!”

O CANGACEIRO TITO SILVA

Autor Manoel Braga

Tito Silva era filho de Wenceslau Silva, que por sua vez era filho de João Silva. Todos eles nasceram na localidade Ilha do Veado pertencente ao hoje município de Peri-Mirim. Contam que Wenceslau passou 1 ano dormindo no cemitério do Souza na Malhada dos Pretos após ter cometido um assassinato.

O crime se deu por causa de uma brincadeira muito comum tempos atrás na Baixada. Era chamada de Serra. Consistia em fazer um ritual fúnebre de uma pessoa idosa que por ventura existisse na comunidade. Era um pouco macabro. Era feita a leitura de um suposto testamento do idoso em que suas coisas eram deixadas para os vivos.

Esse ritual era realizado tarde da noite acompanhado de muita zoada. Todo velho morria de medo de ser serrado. Tinha um instrumento confeccionado especialmente para essas ocasiões chamado de corrupião. Constituía-se de um pedaço de madeira onde era enfiado um fio que a pessoa segurava e rolava sobre a cabeça o que causava um barulho ensurdecedor. Muitas pessoas participavam da brincadeira.

Tinha uns que batiam em lata. Outros imitavam animais. Principalmente o acauã (rasga mortalha). Nesse ritual, o bode era muito comum também. Este geralmente se roçava na parede da casa feita de pindoba para criar o clima de despedida do idoso.

Uma determinada noite a “canalha” resolveu que era chegado o dia de rocar seu João Silva que já estava bem velho. Estava no ponto de ser serrado. Era tarde da noite, estava na hora de começar o ritual. Fizeram zoada. Leram o testamento. Distribuíram as coisas de seu João. Teve um que subiu em uma árvore e começou a imitar o rasga mortalha.

Seu Wenceslau, pai de Tito Silva, muito brabo pegou uma espingarda, esperou o rasga mortalha piar e largou chumbo. Foi só um tiro. O cabra caiu durinho. Acabou a brincadeira. A brincadeira acabou mesmo. Não fizeram mais esse ritual. Mandaram prender seu Wenceslau. Ele para não ser encontrado durante o dia se escondia no mato. À noite vinha dormir no cemitério onde sabia que não iam procurar por ele. E assim ele escapou muito tempo da prisão.

O primeiro prefeito de Bequimão, que nesse tempo ainda chamado de Santo Antônio e Almas foi o capitão José Mariano Gomes de Castro. Era um grande proprietário de terras, fazendeiro, comerciante e delegado. Certa ocasião o prefeito que, também, era o delegado mandou prender Tito Silva acusado de roubo de gado.

Durante a prisão, o denunciado foi muito torturado. Para completar, o delegado trouxe a mulher dele e na frente de Tito foi humilhada, teve suas vestes rasgadas e sofreu abuso sexual. Tito ficou injuriado. Prometeu que se vingaria.

Tito foi enviado para cumprir sentença na fazenda do senhor Antonio Sousa que era grande proprietário de terras na Tijuca. Tito ficou por lá um certo tempo, mas sempre esperando uma oportunidade para fugir. Durante esse tempo ele apresentou um bom comportamento. Ficou de confiança do fazendeiro.

Até que um dia o senhor Antonio chegou de viagem, apeou do cavalo e o entregou para Tito lavar e dá de comer. Era tudo que Tito tanto esperava. Tito aproveitou a oportunidade e deu no pé. Foi embora para o sertão.

Depois de um certo tempo ele voltou, já com um bando formado. Chegou à propriedade de seu Antonio num dia em que ele tinha encomendado uma missa. Tito com seu bando acabaram a festa. Fizeram zoada, deu tiro para cima e em todas as direções.

Dizem que o padre ficou tão assustado que se jogou do segundo pavimento da casa, só não morreu porque caiu dentro de um depósito de melaço. A mãe de seu Antonio, uma idosa, quase morre de susto. Contam que uma bala perdida pegou em uma garota que ficou se contorcendo de dor. Tito vendo aquilo pegou o seu punhal e enfiou na criança acabando com a sua agonia.

Depois dessa confusão toda que ele causou na casa do senhor Antonio Sousa, ele rumou para Bequimão para consumar sua vingança. Chegando lá, ele localizou o Coronel José de Castro. Ele o prendeu. Torturou o quanto pode. Furou os olhos e o castrou. Por último cortou as orelhas que levou para mostrar para a mulher como prova da sua vingança.

No final ele perguntou ao Coronel: – sabe o que vim fazer? – Eu vim te matar. O coronel era homem duro disse para Tito: – homem se mata, não se maltrata. Nisso um dos homens de Tito, achando que o vexame do coronel já tinha sido muito deu um tiro e acabou com o sofrimento do velho.

Depois de consumada a vingança, os homens de Tito se dispersaram. Tito acabou sendo preso. Foi enviado para cumprir pena em uma fazenda do governador do estado que na época era Magalhães de Almeida e que tinha como vice Marcelino Machado. Dizem que os dois mantinham uma relação homo afetiva. Tito estava bem por lá. Bom comportamento e tudo.

Um certo dia, para azar de Tito ele viu os dois se amando. Tito se escondeu. Mas eles ficaram com a dúvida se Tito tinha olhado ou não. Eles tinham medo que a relação deles viesse a público acabando com a trajetória política deles.

Um dia, eles chamaram Tito e perguntaram o que ele tinha visto. Ele disse que não tinha visto nada. Mas eles não acreditaram. Eles botaram Tito para cavar um poço. Quando já estava com uma certa fundura eles perguntaram ao Tito: – tu sabe o que tu tá fazendo e ele respondeu: – estou cavando a minha sepultura. Então, deram-lhe um tiro e o enterraram. E assim acabou a trajetória de vida violenta que Tito levou.

Nota do Autor: Parte desta história deve ser tratada como lenda, pois, baseou-se em ditos dos mais antigos. Sabe-se que pessoas como Tito Silva têm em torno de si muitos mistérios.


Sobre a foto destacada:  Na legenda da foto do livro Adagas & Punhais do irmão @antonioguimaraes355 está: “Cartão fotográfico emitido pelo retratista Joaquim Moura Quinou. Foto em gelatina e prata. Retrato do cangaceiro Tito Silva na cadeia pública de São Luís-MA, pouco antes de ser transferido para o Aprendizado Agrícola Christiano Cruz”. Acervo Antonio Guimarães. Querem programa sobre ele? Eu já queria um filme! Sua história é espetacular. Saiam da bolha, o assunto cangaço é muito maior que o ciclo LAMPIÔNICO.

SALVEMOS A NOSSA LÍNGUA!

Por José Carlos Gonçalves

(Qui linguági é éssa, mermão?!)

Desde que a Linguística, uma ciência espetacular, “invadiu” a universidade, o que deveria ser um efetivo instrumento de enriquecimento da nossa Língua, decretou-se o desaparecimento da Gramática. O que é uma lástima! O povo, que não domina a sua Gramática, tende a se enveredar por caminhos tenebrosos. Sem conexão, sem concordância, sem argumentação. E “outras coisitas mais”. E, olha que não sou um pai de santo, muito menos um purista!
 A verdade é que o ato comunicativo empobreceu de tal forma que a Língua vem-se desfigurando em uma assustadora velocidade. E ninguém que venha com o chocho argumento de que o que importa é se comunicar.

A verdade é que o desastre está posto. E pode ser notado em todas as nossas manifestações. Do incentivo às crianças, que se perdem em uma língua pobre, chula, sem consistência, a esdrúxulas e erradas construções dos telejornais, que não prezam mais nem pelos caracteres a esclarecer o telespectador. Dos livros, sem revisão, eivados de erros gramaticais, aos diálogos de todo instante. Das letras das “músicas modernas” a centenas de influencers, que não estão influenciando. Tem-se quase “um novidioma”.

Se se decreta o fim da Gramática, está junto o fim de bons profissionais. Principalmente, redatores e comunicadores. O pior é que isso já se sente fortemente. E posso bem afirmar, afinal, tenho recebido monografias e TCCs, para correção, que beiram à infantilidade. Haja vista se constituírem de pseudo pesquisas, fundamentadas em “copiar e colar”; trazerem paupérrima, ou nenhuma, argumentação e quase nenhuma observância gramatical. Sem surpresa, não há leitura. Só resta, de verdade, um emaranhado de informações desencontradas, que nada diz. O que será de um profissional desse, que não se empenha no último e vital trabalho de sua formação?! Como será o desempenho em uma entrevista ou na execução de um laudo?! Certamente não terá a perspicácia de um aluno, que tive, em uma grande escola da capital. “Enrolado” em uma prova final, criou, e com criativa criatividade, um fenômeno gramatical, gigantesco, ao fazer uma análise morfossintática. Literalmente. “Profe, esta palavra nada mais é do que um tal de ‘substantivo apronominado’, que, também, é o sujeito”. Misericórdia! Atribui uma bela nota ao nascente “geniozinho”. Mereceu!

E, só para se ter uma ideia de como a “bagunça” é geral, nos últimos dias ganhou repercussão “o ato heroico” de algum técnico do MEC, que “suprimiu” a Língua Portuguesa do tão propalado “Concurso Nacional”. Mas, “de novo”, não há surpresa alguma! Há muito, a Língua já não está nos concursos. O predomínio é de “uma interpretação de texto”, que ninguém desvenda. Acho, até, que nem “os capacitadíssimos elaboradores”. E, interpretar texto, também, passa, e como, por conhecimento gramatical. E, nessa zorra “babélica”, recorrer a quem?! Eita, que já inventei “côsa!” E mais virá. Já irá começar “o festival de preciosidades”. A campanha política.

A verdade é que “tamo no mato, ‘com’ cachorro”. E, dos grandes! Por isso, esta crônica descambou para um desabafo, guardado há muito, ao receber uma mensagem de um leitor, que me pede a volta do Tio Bobo. E, não é brincadeira, não. Foi, simplesmente, telegráfica. Esta última palavra, por pura ironia minha, só a entenderá quem mandou e recebeu telegramas, em longínquas eras. “Zé mermão vc n devi acaba c/ tio bobo e/ é mais manero fdp qui conheço. É do _aralho e mi faiz ri muito. Trás e/ di volta, tá valeno”.

Quase atribuo essa adjetivação a … Mas, “deixa pra lá”. Dos males o menor, pelo “ao” menos, esse leitor tem bom gosto. Gosta do Tio Bobo!
E, “aproveitando essa vibe, parça”, eu, também, faço um pedido. “Salvemos a nossa Língua!”

PASSEIO PELA BAIXADA MARANHENSE

A Baixada no olhar de João Silveira*

Fui dar um pulo na Baxada,
Começando pur Arari,
Ondi cumi melancia
E travessei o miarim.
Passei drento de Vitória,
Mar num achei nada ali.
Ino in Garapé do Meio
Pro mode cumprá farinha,
Arresorvi i in Monção
Ispiá o que lá tinha,
E travessei pra Cajari,
Cidade piquinininha.
Peguei no rumo de Viana
Pra vê se um peixe eu cumia,
Mar de peixe num achei nada,
Lá só tinha carestia.
Daí rumei pra Penalva,

Lugar de boa cachaça,
Terra de bom pescadô,
Cabôco bom de tarrafa.
Num cheguei in Jacaré,
Pois num dava pra ir de a pé
E carro pra lá num passa.
Desci pa Pedo do Rosário,
Mar de lá tive que vortá
Pra incurtá o caminho
E por Matinha passar,
Pra mode cumê u’as mangas,
Qui é produto do lugar.
Seguindo no rumo da venta,
Em Olinda Nova eu parei,
Mas resorvi i adiante
E em São João armoceí.
Terra de caboco home,
Grandes criador de gado.

Lá tem muita gente grande,
Muito cabra indinherado.
Disimbargador e médico,
Já deu inté deputado.
Mar, dizem que a aligria
É quando o boi tá laçado.
Deichando São João Batista,
Pra São Vicente eu rumei,
Quiria cumê carambola,
Pena que num encontrei.
Num sei se num era tempo,
Ou foi um azar que eu dei.
Sai no rumo do campo,
Pra viage continuar.

Passei pur Bacurituba
Mar lá num quis incostar.
Fui inté Cajapió,
Tinha praga pra daná,
Vortei pur riba do rasto
Pra pernoitar in São Bento,
Cumeno um queijinho bom,
Saboreando um mussum
E arroz cum jaçanã dento…
Mar num achei nada disso
Pur lá in lugar ninhum.
Andei, andei… e só vi mermo
Um pução e muinto anum.
Pensei qui in Parmeirândia
Pudesse me arrumar.
Ou mesmo in Peri Mirim,
Qui diz qui é piquinininha,
Mar, eu acho qui né tanto assim.
Entonce, indo adiante
Fui batê in Bequimão,
Cidade bem cuidadinha.

Pur nosso amigo João.
Diz que tem té ponte nova,
Mar pur lá num passei não.
Dali, vortei pra Pinheiro
A princesa da Baixada,
Que, se num é das mais bela,
Mar é uma cidade arretada.
O seu povo todo é rico
E a cidade abastada.
Não pude dechá de ir
In Prisidente Sarney,
U’a cidade pequena
Que fica naquele mei.
Na sagrada Santa Helena,
Da bera do rio vortei.
Pur curpa da Geografia
Eu num fui ao litoral.
Nim Guimarães, Porto Rico,
Cururupu e Cedral,

Muinto meno in Central,
Qui já num son mar Baixada,
Sigundo os intelectual.
Me discurpe os cumpanhero,
Os verso de pé quebrado
I a viage mal’arrumada.
Tava sem tempo i dinhero,
Mar cum o peito apertado
De sardade da Baixada.

(*João Silveira é piscicultor, natural de Matinha – Maranhão, membro fundador do Fórum em Defesa da Baixada Maranhense (FDBM, utilizando o linguajar baixadeiro, presenteia seus conterrâneos com este significativo texto).