Autora: Gracilene Pinto
A jaqueira velha tinha mais de cem anos. Fora plantada pelo meu avô. Como acontece com os idosos, já caducava. Continuava a frutificar, mas seus frutos, de tamanho regular, não tinham mais que quatro ou cinco bagos. Grandes e doces, mas muito poucos, porque o resto todo era de bagos secos.
De passagem por São Vicente, convidei minha tia Morena para um passeio pelo quintal com seu grande pomar em pleno centro da cidade.
Caminhávamos entre árvores antigas e outras mais novas passando por alguns espécimes que quase ninguém planta mais, tais como: carambola, laranja da terra, laranjão, peruana, ginja, etc., quando, para meu espanto e consternação, deparamos com a velha jaqueira, que, carregada de frutos, jazia arriada do chão, com uma parte das raízes expostas, parecendo haver cedido ao cansaço de um século de existência.
Tia Morena explicou-me que a secular e copuda árvore tombara ante a força do último vendaval. Que em São Vicente Férrer, com o calor, de vez em quando o vento se irrita e sai furioso a redemoinhar, maltratando a vegetação e fazendo estragos por onde passa. Dessa vez a jaqueira velha foi a inocente vítima. Acrescentou minha tia, que estava esperando somente a carga de frutos madurar para mandar cortá-la. Tivemos esse diálogo diante mesmo da sua copa arriada no chão e depois seguimos nosso caminho, um pouco mais tristes ante o trágico destino da pobre árvore.
No ano seguinte, ao voltar em São Vicente, ainda encontrei a jaqueira no mesmo lugar e questionei minha tia a fim de saber o que a fizera mudar de ideia quanto a decisão de cortá-la. E tia Morena me contou que nesse ano a safra de jacas surpreendeu a todos. Os frutos não tinham lugar para bagos secos, estavam cheios de amarelos, suculentos e enormes bagos, doces como mel. Quem teria coragem de cortar uma fruteira tão prolífera e dadivosa, mesmo caída no chão?
Será que a jaqueira velha escutou a nossa conversa?