Por Gracilene Pinto
Não sei se pela personalidade ou pelo caráter lendário de suas biografias, duas figuras da História sempre me encantaram: o monarca português Dom Sebastião e o poeta Antônio Gonçalves Dias.
Dom Sebastião, com o misterioso desaparecimento em Alcácer-Quibir, se imortalizou no coração do povo português, que ficou sempre à espera do seu retorno. No entanto, talvez em razão do clima tenso das lutas políticas em Portugal, em busca de paz Dom Sebastião haja escolhido a mais lusitana das províncias brasileiras, o Maranhão, para se encantar no repouso paradisíaco da Ilha dos Lençóis, onde o povo o recebeu com fé no coração: O Desejado Rei Sebastião.
Gonçalves Dias, nasceu em Caxias – Maranhão, mulato, de origem pobre, quando isso ainda era um verdadeiro estigma, por circunstâncias da vida estudou na Europa, foi poeta, advogado, jornalista, etnógrafo e teatrólogo, um expoente do romantismo e do indianismo brasileiro. Mas, entre tantos atributos foi a poesia que o imortalizou, quando cheio de saudades da Pátria escreveu Canção do Exílio, um dos mais belos poemas da língua portuguesa:
Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá…
Não permita Deus que eu morra sem que volte para lá…
sem qu´inda aviste as palmeiras onde canta o sabiá.
e, entre outros poemas maravilhosos da sua riquíssima lavra, quando escreveu a mais bela declaração de amor à paixão da sua vida, Ana Amélia Ferreira do Vale, o Ainda Uma Vez Adeus.
Enfim te vejo! – enfim posso, curvado a teus pés dizer-te
que não cessei de querer-te pesar do quanto sofri…
Por tudo isso, em 03/11/2020, dia em que se rememorava o falecimento de Antônio Gonçalves Dias a bordo do navio Ville Bologna, na Baía de Cumã, em Guimarães, me vi, de repente, pensando que, a despeito dos outros títulos auferidos por ele e de ser patrono da Cadeira nº 15 da Academia Brasileira de Letras, que eu saiba, o poeta não foi membro de nenhuma academia. Não precisou disso. Sua obra o imortalizou. E, quem sabe se, assim como a fé pública encantou Dom Sebastião na Ilha dos Lençóis, Gonçalves Dias não haja se encantado também nos baixios de Atins, de onde já podia avistar suas amadas palmeiras, mesmo que do sabiá só pudesse ouvir o canto na imaginação. Olha, que imaginação de poeta é coisa milagrosa! Acho até que foi por isso que pensei ter ouvido a voz de Gonçalves Dias afirmando cheio de certezas:
É mentira, não morri! Não morri nem morrerei Nem hoje nem nunca mais,
Minha alma já fez morada na pátria dos imortais.
Que lindo texto!
Deslumbrante!
Faz-nos imaginar quanta riqueza nas poesias desse grande poeta. Viva Gonçalves Dias.