Por Gracilene Pinto
O mato todo ainda está molhado
pelo sereno que cai nas madrugadas,
e as ervas do caminho, perfumando,
dão à mulher a paga das pisadas.
Do chão subindo em nuances olorosas,
que a brisa leve levanta pelos ares,
seu cheiro doce invade a alma,
se espalha nos palmares.
A mulher olha o céu agradecida
que ainda não seja o tempo da invernada.
Mesmo sabendo que a água é que dá vida,
com a chuva a tarefa é mais pesada.
Finalmente, adentra o babaçual
onde as altas e viridentes palmeiras
generosas deitam ao chão seus cocos,
sustento único de tantas quebradeiras.
O cofinho, vai na cinta pendurado,
Na mão direita o companheiro patacho,
sua arma e instrumento de trabalho.
Mesmo as coqueiras botando os cocos abaixo,
vai que uma hora precisa cortar um galho?
As palmeiras esparramam pelo chão
seus frutos duros, tão duros como a vida,
mas, vê-se logo também que não é vão
aquele jeito todo de mulher atrevida.
Juntando os cocos, na cabeça põe o cofo,
e do seu peso não reclama, sequer geme,
pois foi talhada para a lida, e seu estofo
é de guerreira, a baixadeira nada teme.
Em casa, logo começa o toc-toc…
Na mão esquerda o coco enfrenta o afiado
machado e sofre os golpes da manceta,
e as amêndoas retiradas com cuidado
vão enchendo a cuia grande ao lado
enquanto o cofo depressa se esvazia.
Quebra o coco, tira o coco, põe na cuia…
passa a mulher nessa labuta o dia inteiro
e o toc-toc da manceta é boa música,
pois, dessa lida é que lhe vem algum dinheiro.
Trabalha e canta para espantar os males
que não há remédio melhor que a alegria,
e assim passa os dias, passa a vida,
passam as mazelas que atormentam o dia a dia.
E ninguém pense que a madrugada a vê insone
a matutar na vida dura que a consome,
após a prece, onde agradece a Deus por tudo,
dorme feliz, pois conseguiu matar a fome.