Lendo um texto de um amigo querido, ao ser provocado, para tecer uma crítica à sua nova obra, deparei-me com a familiar forma “TÁ”, persistente e tão sorridente, a me chamar às origens. E, aí, encontrei a deixa, a me fazer ir em busca de maravilhosas estruturas, que me marcaram a infância / adolescência na Baixada maranhense. Estruturas, que, para os autênticos baixadeiros, tão distantes e saudosistas, muitas vezes, ainda “escapolem” e vão se fazendo presentes. Não surpreendem nem se tornam estranhas. Pelo contrário, satisfazem “o pensar alto”, de quem se permitia “se achar, ser o que a folhinha não marcava, ser o lindão, ser a última bolacha do pacote” e que, para isso, empregava “Tá se achano, tá nos pano, tá na crista da onda”. E, se fosse um pouquinho mais ousado, apelava a “tá facinho, tá só safadeza, tá no viço, tá na vala, tá na vida”. E, se se fechasse em copas, a dureza e a insensibilidade do sentir vinham. “Tá cum um coração de pedra, tá um coração de gelo, tá na rua da amargura”.
E, nessa perspectiva, íamos colecionando “TÁS”. Assim, o encontrar um amigo magro se traduzia em “tá só urelha, tá só couro e osso, tá só o curéu, tá só o talo, tá só a titela, tá só o cambito, tá cumeno vento, tá passano fome, tá sumino”. E, na inversão do peso, choviam elogios. “Tá bunito, tá sadio, tá passano beim, tá de bucho cheio, tá rico”. Era como se “a miséria e a fartura” fossem se concretizando com a mesma gana. Esta, com euforia; aquela, com comiseração.
E o desfile continuava a se fazer. A ira e a danação se enfeixavam em uma aliança perfeita. “Tá cum sangue no ôlho, tá impussívi, tá de ovo virado, tá pintano o sete, tá com o dhiabo no côro, tá ispritado, tá indemonhado, tá virado no cão”.
O ingênuo e o descompensado se identificavam, no mesmo compasso. “Tá com cara de nhô zé, tá de ovo virado, tá de miolo mole, tá chiladinho, tá zorongo, tá muchinho da silva, tá tanso, tá no mundo da lua, tá biruta, tá lelé da cuca”.
“A belezura”, também, não se fazia de rogada e se insinuava em cândidas sentenças. “Tá na flor da idade, tá um pedaço de mau caminho, tá chêrano a leite”. Mas, de verdade, o menosprezo vinha forte. “Tá cum o rei na barriga, tá mais liso que peixe de água doce, tá mintino de cara limpa, tá faltando com a verdade, tá sortano cachorro cum linguiça, tá contano lorota”.
Já “a desboniteza” se fazia cruel, a se utilizar de uma máxima assustadora e açoitante. “Tá o cão chupano manga”. E a ambiguidade dançava entre o reprovável e o aceitável. Ficava ao gosto do freguês. “Tá a cara dum e fucinho dôto ou tá cuspido e iscarrado o tio”. Torcíamos para “a simpatia” do tio. Misericórdia!
Para não esquecer, uma sentença, tão significativa e espetacular, se traduzia no desprezo, no tanto fazia, no não ligava, no cúmulo da indiferença. “Tá cagano e andano pra tu!”
E, nessa sequência de TÁS, a gradação se tornava vibrante, a narrar o infortúnio e a graça eterna de um indivíduo. “Tá no istaleiro, tá disinganado, tá só esperano a hora, tá na hora da morte, tá incumendado, tá na pedra, tá morto e interrado, tá morando com Deus!” Cruzincredo! “Tá repreendido!”